Edgar Andrade
Você acha que as empresas estão preparadas para a diversidade etária?

Hoje, participei de uma entrevista no Boletim Cidades @RevistaAlgoMais da #CBNRecife sobre os desafios do envelhecimento da população das cidades. E tendo o @fablabrecife como uma startup embarcada no @portodigital, um dos maiores ecossistemas de tecnologia e inovação do país, não poderíamos deixar de falar sobre o desafio da #diversidade e #inclusão etária de pessoas idosas no mercado de trabalho – sobretudo o do mercado produtor de novos produtos e serviços de base tecnológica. Como não deu pra falar tudo o que gostaria, chamei @crislacerda, minha sócia e CTO do Fab Lab Recife, para organizar o papo que tivemos como preparação para a entrevista e que virou esse texto. Espero que você curta e comente lá embaixo. Simbora!
Começamos pensando que se o trabalho é um desafio imenso hoje, imaginem como será daqui a 20, 30 anos? Conseguem? Vamos lá... nos próximos 10 anos, a população idosa brasileira saltará de 28 para 43 milhões de pessoas. Esse envelhecimento vai trazer uma mudança de estrutura geral que impactará a vida de todas as pessoas. Em sete décadas, a média de vida do brasileiro passou de 45,4 anos, em 1940, para 75,4 anos em 2015. Segundo o IBGE, até 2055 o número de pessoas com mais de 60 anos deve ultrapassar o de brasileiros e brasileiras com até 29 anos. E se você botar nesse caldeirão de transformações radicais o impacto de tecnologias como inteligência artificial e internet quântica, e ainda juntar com uma queda radical da oferta de empregos no planeta, vamos ter um cenário potencialmente traumático se não mudarmos a forma como consumimos coisas e nos relacionamos em sociedade desde hoje.
Precisamos entender que a tecnologia deve ser ferramenta a serviço das pessoas e não o contrário. A lógica clássica do nosso modelo de sociedade baseada no consumo precisa ser revista urgentemente. Acredito, cada vez mais, em um modelo que deixa de ser pautado no desenvolvimento a qualquer custo e passa a ser definido pela promoção da felicidade humana. Para isso, no tema da entrevista sobre o envelhecimento da população nas cidades, a Organização Mundial de Saúde recomenda aos municípios que sigam as 08 dimensões da vida que podem influenciar a saúde e a qualidade de vida das pessoas idosas. Então vamos destacar algumas dimensões que podemos promover mais impacto com o trabalho do Fab Lab Recife e do Canal Maker, através da iniciativa Fab City Recife: espaços públicos e habitações, participação cidadã e inteligência coletiva, empreendedorismo e qualificação profissional, comunicação e informação. Talvez um dos maiores desafios, pensando na população idosa, ainda seja o das calçadas - e há anos que pessoas como Francisco Cunha batem muito forte nesse tema. Como estimular as pessoas idosas a fazerem caminhadas, por exemplo, se podem sofrer acidentes ao saírem de casa?
Entendo que evoluímos um bocado nos últimos anos, mas ainda falta muito, principalmente nas periferias. As calçadas são as artérias que conectam as pessoas com os espaços públicos e, nesse sentido, é fundamental pensarmos em micro espaços de convivência espalhados pelas cidades. Podemos, por exemplo, aproveitar alguns daqueles espaços que separam ruas com gelos baianos, ou transformar vagas de carros em espaços de descanso, encontro e contemplação - e isso são soluções globais que já estão na rua há anos e implementamos algumas por aqui, como o Parkletric, nossa versão de parklet com conexão wifi e pontos de carregamento de gadgets que ficou quase 1 ano na Praça do Arsenal, e o Parque Horta, com a Comunidade do Pilar, para promover a agroecologia colaborativa em locais onde não há terrenos urbanos disponíveis.
A tecnologia vem abrindo possibilidades para que a gente deixe as cidades e as casas mais seguras, confortáveis e acessíveis para as pessoas idosas. A bronca é o custo ainda elevado para essas soluções, mas que deve cair nos próximos anos. É preciso, também, criar mecanismos de estímulo e ampliação da participação das pessoas idosas nos fóruns de decisão dos rumos da cidade. Estamos conversando com Claudia Silveira, especialista em inclusão digital de pessoas idosas, e ela vem nos apoiando nos movimentos que estamos fazendo e pretendemos ampliar. Por exemplo, precisamos abrir janelas para que as pessoas idosas consigam se comunicar melhor entre si e com o resto da sociedade. Nessa pauta com Claudia estamos planejando a criação de uma web série para o Canal Maker focada nesse tema. A gente fala muito sobre o futuro mas temos desafios de curto prazo que são urgentes e envolve a inclusão digital de quem tem mais de 60 anos, hoje.
Mas talvez uma das pautas de maior urgência sobre o envelhecimento da população nas cidades é o da diversidade etária no mercado de trabalho - sobretudo no mercado que empresas e startups como o Fab Lab Recife se encontram, da tecnologia e inovação, quase sempre atrelado ao imaginário da população jovem. Essa é uma pauta urgente pela convergência de diversos fatores como o aumento da expectativa de vida da população, a capacidade de inclusão produtiva para além dos 60/65 anos, as dificuldades de aposentadoria com a nova previdência, e a crise econômica gerada pela pandemia, com a qual pessoas idosas não apenas ‘podem’ trabalhar, mas ‘precisam’ continuar no mercado para garantir renda. E como será o futuro emergente das pessoas idosas no mercado de trabalho?
É importante registrar que falo muito sobre o futuro, mas não sou futurista, ok? Me considero um presentista e vivo repetindo sobre o que podemos fazer hoje para construirmos um futuro mais justo para todas as pessoas de todos os lugares. E, na nossa visão, no Fab Lab Recife e no Canal Maker, esse processo envolve, antes de qualquer coisa, a escuta. É preciso conversar mais e entender melhor as demandas das pessoas cujo problemas desejamos ajudá-las a resolver. Isso vale para qualquer público e para as pessoas idosas exige muito mais cuidado e atenção, sobretudo quando envolvemos novas tecnologias. Como estamos vivendo um processo de transição de uma sociedade analógica para uma sociedade digital, as pessoas idosas precisam muito da nossa ajuda pois a inclusão digital é determinante para que tenham qualidade de vida.
A partir da escuta e da imersão nos problemas é que passamos para a prática, criando, prototipando e testando experiências que ajudem a resolver ou minimizar problemas relevantes. Desde 2018 que voltamos nossos olhos para o tema, quando realizamos uma sequência de Prototyping Sprints para empresas associadas à @softexrecife. O Prototyping Sprint é uma oficina ágil do Fab Lab Recife que integra métodos colaborativos e design transdisciplinar para prototipagem rápida de novos produtos, serviços e soluções, estimulando a cultura maker como processo criativo na resolução de problemas de grupos ou times corporativos. Na primeira edição do nosso sprint, no início de 2018, trabalhamos o tema Envelhecendo Ativamente, com o desafio da prototipação, em apenas 8 horas, de soluções que auxiliassem pessoas idosas a continuarem realizando tarefas do dia-a-dia.
Foram muitos protótipos incríveis, desenvolvidos por pessoas de diversas áreas e idades nas empresas. Como exemplo de alguns protótipos criados com eletrônica básica e corte a laser numa experiência imersiva por quem nunca havia utilizado a fabricação digital, surgiram soluções como um cinto com geolocalização para ajudar pessoas com alzheimer, incluindo um botão de emergência para pedirem ajuda ao se verem perdidas; um carrinho de compras articulado com a lógica de macas de ambulância, com o qual a pessoa idosa não precisaria abaixar e carregar sacolas, mas entrar com o carrinho e retirá-lo direto na mala do seu carro; e a junção de duas tendências na 3ª idade: o aumento de pessoas idosas independentes morando sozinhas e com pets para fazer companhia, assim como o aumento de serviços de passeios, viagens e excursões para pessoas idosas. A equipe criou um dispenser de ração para pets, com temporizador ou controle por celular, para alimentar os animais durante a ausência.
Ao longo dos últimos anos aqui no LinkedIn, Cris vem pesquisando e compartilhando diversos conteúdos sobre diversidade e inclusão no ambiente corporativo, com viés forte na questão de gênero. Mas somando, também, diversas vertentes da inclusão social como o conflito geracional e a diversidade etária, com olhar especial às pessoas idosas no mundo da tecnologia e inovação - e olhe que um dos seus temas preferidos de pesquisa é o nativismo digital das gerações Z e alpha. Compilamos aqui alguns exemplos desses conteúdos com discussões interessantes sobre o tema:
Há 2 anos, @silviomeira já levantava neste post a questão do mito da criação de startups por jovens de 20 anos, mostrando que a média de idade das pessoas criadoras de negócios de sucesso é de 42 anos.
A realização, no mês passado, do @forumgeracoesefuturodotrabalho, primeiro fórum brasileiro sobre diversidade etária e a questão geracional nas empresas. Você ainda pode assistir à gravação da abertura do fórum no canal da @maisdiversidade no Youtube.
Ações afirmativas e programas de equidade no mercado de trabalho também precisam começar a englobar a inclusão etária, como vemos nesta matéria da @valoreconômico que mostra novos programas que incluem profissionais com maior maturidade.
Além de questões interseccionais, como as relacionadas com diversidade etária e de gênero, neste artigo que mostra que um relatório da Dow Jones de 2012 já apontava que as empresas com pelo menos uma executiva sênior têm mais chances de sucesso do que as empresas que têm apenas homens no topo.
O que levamos de tudo isso é que precisamos experimentar mais para criar soluções realmente relevantes para a sociedade, incluindo perfis diversos como mulheres, pessoas negras, com deficiência, LGBTQIA+, de comunidades de base e outras interseções da diversidade como pessoas idosas para o processo de co-criação e prototipação das soluções. O conversar, o falar e ouvir, tem que estar associado ao #fazer: não dá pra ficarmos só na conversa, precisamos nos juntar - e diversificar - para materializar, hoje, as empresas que queremos para o futuro.