Edgar Andrade
Da visão de Célia Xakriabá ao Tempo Tríbio de Gilberto Freyre e o otimismo de Stephen Hawking

Tem é tempo que venho falando e escrevendo sobre o futuro das escolas, das cidades, dos negócios, sobre como consumiremos coisas nesses futuros possíveis. E desde que me deparei com o conceito do Tempo Tríbio, de Gilberto Freyre, tive a convicção de que tudo acontece ao mesmo tempo, e somos o resultado de tudo o que fizemos em nossas trajetórias, com todos os erros e acertos, olhamos o tempo todo para o futuro com a expectativa de sermos melhores que somos no presente, e a melhor forma de materializar futuros é colocando em prática, diariamente, experiências que nos direcionem para o caminho em que acreditamos.
Segundo Gilberto Freyre, se ficamos presos ao passado, nos tornamos arcaicos, se só olhamos para o futuro, nos tornamos utópicos, que o ideal é vivermos o Tempo Tríbio, sempre buscando referências do passado, construindo hoje o futuro.
Tudo isso estava bem resolvido na minha cabeça e nas minhas falas. Até o encontro com Célia Xakriabá, Mapu Huni Kui e Alok no Rio2C, na semana passada. Fui atraído pelo título do painel: “Antes do Brasil da Coroa existe o Brasil do Cocar”. Pensei: “quero ver o que esse boyzinho (Alok) tá fazendo com essa galera dos povos originários do Brasil. Sentei meio curioso e de cara a primeira lapada. A exibição de um clipe produzido para o Global Citizen Live Amazon, em 2021, com a missão de chamar a atenção para o aquecimento global e a demarcação das terras indígenas. O desmatamento em terras indígenas foi de apenas 1% em 30 anos, enquanto, em áreas privadas, a destruição chegou a 20,6% no mesmo período (MapBiomas).
Respirei. Entra o músico, líder espiritual e cacique Mapu Huni Kui, do Acre. Começa com um rezo (oração) e criou o ambiente perfeito para uma sequência de provocações que buliram com meu juízo. Sabe quando o povo diz que muitas vezes o genial é óbvio? Pronto! Mapu e Alok trouxeram uma sucessão de obviedades geniais. Num momento Alok contou a história da necessidade de criarmos alguma tecnologia capaz de transformar gás carbônico em oxigênio, viagem lá daquele menino, Ellon Musk. Na sequência emendou dizendo que essa tecnologia já existia e se chama ÁRVORE.
Quando Célia Xakriabá começou a falar, senti uma energia muito forte tomando conta do teatro. Pense numa potência essa mulher! E a cada fala era uma lapada, um chacoalhar no meu juízo. Mais uma vez, diversas obviedades que talvez só passem batido por quem é homem, branco e privilegiado como eu. E o principal gatilho, na minha cabeça, veio da conexão entre o futuro e a ancestralidade. Não basta reconhecer as referências do passado como costumava dizer. Precisamos fazer um mergulho profundo nas raízes que formaram nossa sociedade, e mais ainda nas referências historicamente ignoradas ou absurdamente invisibilizadas. Parece piada a história da criação de uma máquina que substitua a árvore, mas não é. Quantas tecnologias da natureza e dos povos originários brasileiros e mundo afora insistimos em ignorar ou nos apropriar sem dar créditos às fontes originais? Quando Célia fala que o Futuro é Ancestral, e que devemos mergulhar nele, começo a entender um pouco do sentido da transmissão dos saberes através da oralidade. E começo a pensar se nossa grande capacidade de guardar informações em caixas ou nuvens é tão inteligente, se não conseguimos transmitir conhecimento, compartilhar nossas experiências. Demorei um bocado pra escrever e tenho consciência de que esse texto é apenas a introdução do que está acontecendo nesse momento com meu juízo. Uma agonia intensa para rever essa conexão entre passado, presente e futuro, para talvez encontrar um novo exercício em que possa misturar o olhar de Célia Xakriabá com as viagens em alguns momentos pessimistas e em outros, otimistas de Stephen Hawking sobre o nosso futuro.
“Depois de inventar o fogo e meter os pés pelas mãos com ele, inventamos o extintor de incêndio. Com tecnologias mais poderosas como armas nucleares, biologia sintética e inteligência artificial avançada, devemos planejar com antecedência e tentar fazer as coisas direito da primeira vez, porque ela poderá ser nossa única chance. Nosso futuro é uma corrida entre o potencial de crescimento da tecnologia e nossa sabedoria ao usá-la. Precisamos garantir que a sabedoria vença.” Hawking, Stephen. Breves respostas para grandes questões.
Já separei um mói de conteúdo pra estudar e espero, em breve, compartilhar com vocês o resultado dessa nova doidice em meu juízo. Mas estava numa agonia imensa para tirar da cabeça essa primeira onda de reflexões e inquietações, porque uma das poucas certezas que tenho na vida é que é bom demais mudar de opinião, redefinir crenças, nos conectar com outros olhares e de repente: eita! Seguir outro caminho! E contamos com uma ferramenta poderosa para nos ajudar em nossas trajetórias de vida e mais uma vez recorro a Stephen Hawking, que é a IMAGINAÇÃO.

Pra fechar, Alok convidou a plateia a compartilhar e propagar a visão do Futuro Ancestral, que esse projeto não era dele e precisaria de muita gente chegando junto. Quero chegar. Mapu ainda contou do restaurante que estão para inaugurar com a missão de compartilhar os saberes gastronômicos dos povos indígenas com o Brasil e com o mundo, aí foi demais pra mim. Saquei o telefone e na hora mandei uma mensagem para o amigo Daniel Zen do Acre: “Véi, preciso voltar por aí e tenho que conhecer de perto o que Mapu está fazendo. Me convide!!”.
Esse texto é um primeiro convite para que você mergulhe nessa experiência e faça uma reflexão sobre o quanto podemos resgatar da cultura ancestral para nos ajudar a ressignificar o presente e desenhar o futuro. Meu novo olhar sobre o futuro começa com esse texto, vamos ver o que virá daqui pra frente. Bora Moer?